Por Nelson Bomilcar
Comunidades cristãs
vão se formando com novas caras e facetas no Brasil, em todas as classes
sociais. Casas, escolas, hotéis, clubes e ginásios tornam-se caminhos diversos,
mais interessantes e pertinentes dependendo da realidade urbana para sua
instalação. Pensar em ajuntamento de cristãos nos templos com projetos
arquitetônicos tradicionais ou contemporâneos, com médios e grandes espaços
cada vez mais difíceis e raros, e com toda sua complexidade legal, financeira e
estrutural, vai se tornando um projeto menos desejável e viável para muitas
igrejas e grupos eclesiásticos.
Em cima dessa
realidade desafiadora e pouco encorajadora, o pastoreio é ainda um caminho mais
complexo, no qual, muitas vezes, a expectativa pela ação pastoral diante das
necessidades das pessoas em dor, sofrimento e outros diversos clamores vai
dando lugar a sentimentos e percepções extremas: uma parte do rebanho continua
desejando esse cuidado pessoal e acolhedor dos pastores e da liderança,
enquanto que gente com boa quilometragem, rodada nas igrejas, já “jogou a toalha”
e não acredita mais ser possível esse pastoreio, vivendo uma insatisfação
contínua. Alguns buscam caminhos de sobrevivência em movimentos localizados e
nas redes sociais; outros simplesmente desistem e se afastam dos ajuntamentos.
Pela extrema
valorização da figura ou da autoridade de pastores, numa cultura como a nossa –
na qual os grandes líderes são incensados e onde se cria e nutre uma relação de
extrema e inapropriada dependência –, vai se esvaziando o cuidado e a
responsabilidade de um para com outro no rebanho. Desvalorizam-se os membros do
corpo de Cristo, com seus dons e funções, e o senso de responsabilidade de cada
irmão em oração, acolhimento, compartilhamento, conselho mútuo, exortação,
visitação, serviço e fortalecimento de amizades espirituais. Jogar a
responsabilidade do cuidado pastoral somente sobre uma pessoa ou uma reduzida
liderança é, no mínimo, irreal, imprudente e imaturo, seja em grandes
ajuntamentos ou não. Claro, não se pode minimizar a importância daqueles que receberam
dons específicos para serem pastores e mestres, presbíteros e diáconos,
conforme a recomendação bíblica. Mas tal esvaziamento reflete, em primeiro
lugar, o descuido de muitos irmãos no cultivo de uma espiritualidade saudável.
Eles abriram mão da oração e da meditação na Palavra, da comunhão com Deus Pai,
Filho e Espírito Santo em primeiro lugar. A desvalorização da intimidade e do
alimento da fé, e de uma dependência maior de Deus, foi deixando lacunas
significativas.
Em segundo lugar, a
supervalorização de pessoas, e a dependência exagerada delas, acabou trazendo
como consequência a superficialidade Uma vida superficial, sem características
de profundidade e maturidade, e destituída de uma visão encorajadora da fé
cristã e da missão que nos foi confiada por Jesus Cristo é o resultado disso.
Acabamos nutrindo uma visão egoísta e antropocêntrica, quase sempre ignorando o
próximo a quem temos de servir e ajudar com o que somos e possuímos. Membros de
ajuntamentos vão se tornando mais exigentes, achando que as igrejas precisam
saciar suas necessidades nem sempre legítimas diante da proposta bíblica da
natureza e missão da Igreja. Então, o mercado da fé percebe a lacuna e acaba se
instalando para compensar aquilo que nós não encontramos no pastoreio ou na ação
pastoral cuidadosa.
Seja com que formato for e
onde se instalarem, os ajuntamentos cristãos não podem abdicar da verdade do
Evangelho, da mensagem das boas novas e de todo o conselho de Deus que é a sua
Palavra. Ora no meio de desertos e provas, ora em pastos verdejantes e águas
tranquilas, ovelhas precisam, em primeiro lugar, depender mais do pastor Jesus
e buscar crescimento nesta relação de dependência e mentoria; em outras
palavras, depender mais de Deus do que de homens, sem desmerecer o valor do corpo
de Cristo e das pessoas e líderes que o Senhor tem colocado em seu caminho.
Tudo isso para sermos melhores testemunhas, melhores servos, melhores cristãos,
vivendo a experiência comunitária de forma consciente e responsável e que não
nos deixe perder o compromisso e a vivência da missão cristã – e, muito menos,
nossa responsabilidade de anunciar e sinalizar o Reino.